O cenário das relações de trabalho no Brasil passará por uma transformação significativa com a entrada em vigor da Portaria MTE nº 3.665/2023, prevista para 1º de julho de 2025. Esta nova regulamentação altera substancialmente as regras para a convocação de empregados para o trabalho em domingos e, principalmente, em feriados, com um impacto direto e profundo sobre o setor de comércio e serviços. A mudança central reside na revogação da autorização permanente que permitia o funcionamento de diversas atividades nessas datas, condicionando, a partir de agora, a operação à existência de uma negociação coletiva prévia com a entidade sindical representativa da categoria. Essa alteração legislativa restabelece a primazia da negociação coletiva, um princípio já delineado em legislações anteriores para o setor do comércio. Após uma série de adiamentos, a nova data de vigência impõe aos departamentos pessoais e gestores uma necessidade urgente de reavaliação de suas práticas e escalas de trabalho. O fim da autorização automática, anteriormente consolidada pela Portaria nº 671/2021, transfere a responsabilidade da permissão de trabalho do poder executivo para a mesa de negociação entre empresas e sindicatos, tornando a Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) ou o Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) o instrumento indispensável para o funcionamento em dias de feriado. LEIA MAIS: RH - Como fazer a análise de desempenho da equipe O que muda no trabalho aos domingos e feriados?A principal consequência da Portaria nº 3.665/2023 é a obrigatoriedade de autorização expressa em instrumento coletivo para o trabalho em feriados para um rol específico de atividades. Anteriormente, muitas dessas categorias dispunham de uma permissão de caráter permanente para operar, o que simplificava a gestão de escalas. Com a nova regra, a ausência de uma CCT ou ACT que verse especificamente sobre o tema torna a convocação de trabalhadores para essas datas uma prática irregular, sujeita a sanções administrativas e passivos trabalhistas. O departamento pessoal assume, portanto, a vanguarda na verificação e garantia dessa conformidade. Os setores mais diretamente afetados por esta mudança são aqueles ligados ao comércio. A nova norma exigirá negociação sindical para atividades como o comércio varejista de alimentos essenciais (carnes, peixes, frutas, legumes, aves e ovos), farmácias, comércio em hotéis, aeroportos, portos e rodoviárias, bem como o comércio atacadista, distribuidores e revendedores de veículos. Essas atividades, que frequentemente operam em feriados para atender à demanda do consumidor, agora dependerão inteiramente do sucesso das negociações com os sindicatos para manterem suas portas abertas nessas datas estratégicas. Por outro lado, é fundamental destacar que a medida não se aplica a todos os setores de forma indiscriminada. Atividades cujas operações em domingos e feriados já são regidas por legislação própria e específica, como em certas áreas do turismo, lazer e transporte público, não são alcançadas pela nova exigência de negociação coletiva. Da mesma forma, os serviços considerados essenciais, como saúde, segurança e energia, mantêm suas prerrogativas de funcionamento inalteradas. As atividades comerciais que não foram expressamente listadas na portaria continuam regidas pela norma anterior, mantendo a permissão de funcionamento. Para as empresas, o impacto imediato é o aumento da complexidade na gestão das relações de trabalho. A necessidade de negociar com sindicatos introduz uma camada adicional de burocracia e pode representar um desafio, especialmente para empresas de pequeno porte, que possuem menor poder de barganha. O risco de não obter um acordo a tempo pode comprometer o faturamento e a operação em períodos de alto movimento. Além disso, a operação em desacordo com a nova norma eleva exponencialmente os riscos de autuações por parte da fiscalização do trabalho e de condenações em processos judiciais. Do ponto de vista dos trabalhadores, a mudança fortalece a representatividade sindical e abre espaço para a conquista de contrapartidas mais vantajosas. A negociação pode resultar em benefícios adicionais, como a majoração de bonificações, o aumento da participação nos lucros e resultados (PLR) ou a definição de regras mais claras para a concessão de folgas compensatórias. É importante ressaltar que a regra basilar de remuneração – pagamento do dia em dobro ou concessão de folga compensatória – permanece intacta. Contudo, a restrição ao trabalho em feriados pode impactar negativamente aqueles colaboradores que contavam com a renda extra proveniente dessas jornadas. Neste novo contexto, o papel do departamento pessoal transcende a mera administração de folhas de pagamento e escalas. O profissional de DP torna-se um guardião da conformidade legal e uma ponte estratégica entre a empresa, seu departamento jurídico e a entidade sindical. Compete a este setor a responsabilidade de monitorar continuamente a vigência e o conteúdo das convenções coletivas, instruir gestores sobre os riscos associados à não conformidade e antecipar-se aos problemas, iniciando o diálogo com os sindicatos antes que a ausência de um acordo se torne um impedimento operacional. Implementação da mudançaA implementação da Portaria nº 3.665/2023 representa uma reconfiguração fundamental na dinâmica do trabalho em feriados no Brasil, recolocando a negociação coletiva no centro das decisões operacionais do comércio. A medida visa fortalecer os mecanismos de diálogo social e garantir que o trabalho em dias destinados ao descanso seja acompanhado de compensações justas, formalizadas por meio de acordos entre as partes. Para as empresas, a mudança exige uma postura proativa e uma gestão de riscos muito mais apurada.
Diante do prazo final de 1º de julho de 2025, a inação não é uma opção. É imperativo que os profissionais de departamento pessoal iniciem imediatamente um diagnóstico interno para identificar se a empresa está entre os setores afetados. Caso positivo, o passo seguinte é verificar o status das negociações coletivas e estabelecer um plano de ação para garantir a regularidade das operações. A antecipação, o monitoramento constante e a comunicação transparente com a gestão e os sindicatos serão os pilares para navegar com segurança por esta nova realidade trabalhista e evitar severos impactos operacionais e financeiros.
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